Um
leão foi ferido pelos chifres de um touro. O rei dos animais baixou uma
ordem, então, para expulsar do reino todos os animais que tivessem
chifres. Espalhada a notícia, cabras, touros, carneiros, veados, corças,
fizeram as suas trouxas e mudaram de ares. Uma lebre que comia grama,
vendo a sombra das suas orelhas, achou-a parecida com chifres e resolveu
ir embora também, apavorada com a possibilidade que os guardas do rei
leão a descobrissem. Antes de se afastar foi despedir-se do amigo grilo
que ficou admirado com a decisão da lebre. O grilo tentou de todo jeito
fazer a lebre voltar atrás na decisão tomada, mas não conseguiu, pois
esta confessara que morria de medo ao pensar que alguém poderia se
enganar, pensando que suas orelhas fossem chifres.
Uma historinha antiga e popular para nos lembrar com quanta
facilidade e superficialidade, muitas vezes, julgamos os outros e, por
consequência, somos julgados. Justamente porque vivemos em comunidade
somos objeto dos olhares e das críticas alheias. Em muitos lugares,
hoje, lemos avisos com as palavras: “Sorria, você está sendo filmado”. É
um alerta para saber que alguém está nos reparando através de uma
telecâmera. Talvez não seja sempre verdade, mas é melhor não arriscar.
Ninguém gosta de ser surpreendidos por uma multa entregue pelo Correio,
ou por um vigilante na saída do Supermercado querendo surrupiar nossa
bolsa. Tudo em nome da segurança, podemos até concordar. A questão é
que, quase sempre, o olhar dos outros é também um julgamento. A frase
poderia ser mudada em: “Sorria, você está sendo julgado”, que não
mudaria quase nada, porque é o que acontece. Vendo os outros fazerem
alguma coisa, já especulamos o que seja e o porquê o estejam fazendo.
Difícil escapar da imaginação dos outros. Obviamente, isso vale também
para nós: o que não sabemos, inventamos. Se depois a bisbilhotice
eletrônica se espalha com a velocidade da luz, pouco importa. O estrago
já foi feito, ou, quem sabe, tenhamos defendido a verdade e desmascarado
a mentira.
Nada de mais atual que o caso da mulher do evangelho deste domingo
surpreendida em flagrante adultério. Culpa tão grave de merecer, naquele
tempo, e com aquelas leis, o apedrejamento. Talvez hoje as pedras que
temos nas mãos sejam as mensagens da internet, mas continuam sendo,
muitas vezes, fatais. Quantas pessoas sofrem por muito tempo as
consequências de uma exposição caluniosa ao público ávido de novidades e
de escândalos. Raramente, depois, dá para desfazer o mal causado.
Como cristãos devemos ser sábios e prudentes. Não somente pelas
palavras de Jesus: “Quem é sem pecado atire a primeira pedra” (Jo 8, ),
mas sobretudo para não confundir o pecado com o pecador. É verdade que o
pecado existe porque existe quem o pratica e, portanto, é algo de real e
não uma mera ficção. No entanto Jesus nos lembra da cura da
misericórdia e do perdão justamente para salvar a vida do pecador. “Pois
Deus enviou seu Filho ao mundo não para condenar o mundo, mas para que o
mundo seja salvo por ele” (Jo 3,17). Salvação que quer alcançar a
todos, também aos que estão julgando a mulher! A eles também Jesus
oferece o perdão na condição que se reconheçam pecadores e mudem de
vida. O pior para nós todos é quando queremos julgar sem sermos
julgados; queremos condenar os outros nos considerando melhores. Talvez
sejamos tão responsáveis das coisas erradas do mundo quanto aqueles
nossos irmãos que condenamos; não pelo mal que talvez, graças a Deus,
não fazemos, mas, simplesmente, pelo bem que deixamos de fazer.
O mal não é vencido pelas condenações, mas pelo amor que resgata,
pela caridade que ajuda a sair das situações perigosas, pela
solidariedade que humaniza a vida. Nós cristão acreditamos que nenhum
ser humano pode vencer o mal por sua própria conta, precisa se deixar
amar – até a morte na cruz – pelo amor de Jesus. Amor gratuito, total,
para todos. As palavras finais do evangelho são: “Mulher, ninguém te
condenou?… Eu também não te condeno. Podes ir em paz e, de agora em
diante, não peque mais”. Hoje podemos dizer, com razão, uns aos outros:
Sorria, você está sendo salvado . Pelo amor de Jesus.
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